Faça o seguinte teste: pergunte a dez pessoas quem é, na opinião delas, o pai da odontologia. Das dez, quatro vão dizer que não fazem a menor ideia, três vão responder Hipócrates (o da medicina) e três vão falar Sócrates (o filósofo, ou seria o jogador?).
Isso pode até parecer engraçado, mas perde um pouco da graça quando descobrimos que os dez entrevistados são profissionais de odontologia e não, teoricamente, "leigos" no assunto. E isso vai perder totalmente a graça quando você parar para pensar um pouco e ver que também não sabe a reposta!
Então, vamos a ele.
Para início de conversa, Farchaud não era dentista (!), era médico (?!). Mas antes que voltemos àquela velha rivalidade, devemos ter em mente que na época em que ele viveu, a odontologia não existia como ciência autônoma, era apenas mais um ramo da medicina.
Pierre Farchaud era francês e viveu entre os anos de 1678 e 1761. Ao contrário do que a imagem acima pode sugerir, ele não nasceu "em berço de ouro". Sua infância humilde o levou a trabalhar desde cedo. Com apenas 15 anos, por dificuldades financeiras, se viu obrigado a ingressar na marinha, e foi nela que Farchaud teve seus primeiros contatos com a prática odontológica. Chamou-lhe a atenção o fato de que marinheiros que permaneciam muito tempo no mar desenvolviam determinadas doenças bucais, como destaque para o escorbuto.
Mais tarde, Farchaud deixou a marinha e ingressou na Universidade de Angers, onde deu seguimento aos estudos sobre a cavidade oral. Foi nessa época que ele desenvolveu a maior parte de seus materiais de trabalho odontológico, os quais são predecessores de muitos dos instrumentos utilizados hoje em dia.
Partindo de instrumentos que nada tinham a ver com a prática médica; dentre os quais tem-se materias para confecção de jóias, marca-passos e materiais utilizados por barbeiros; Pierre construiu uma grande variedade de objetos, como o fórceps, ilustrado abaixo em desenho do próprio Farchaud. Qualquer semelhança com o alicate usado na confecção de bijouterias não é mera coincidência.
Pierre Farchaud destacou-se também como o pioneiro da prótese dental, tendo sugerido e aplicado uma série de materiais para a substituição de dentes perdidos, como o osso e o marfim. Partiu dele também a ideia de que o tratamento de cáries deveria ser dado com o preenchimento da porção destruída do dente por material que viesse a substituir a estrutura lesada. Além disso, ele foi o primeiro a afirmar que compostos ácidos derivados do açúcar seriam os responsáveis pelo dessenvolviemento de cáries e que restrições de açúcar na dieta poderia prevenir a incidência de cáries. Essas ideias, tão comuns para nós, foram simplesmente revolucionárias para a época de Farchaud.
Abaixo, páginas do livro "O Cirurgião Dentista" a grande obra de Pierre Farchaud, onde ele introduz ideias até então inéditas para o campo da odontologia e apresenta os novos instrumentos para uso dontológico.
Algumas das novas ideias presentes na obra:
- Cáries não eram produzidas por vermes (crença comum daqueles tempos). O que foi provado pelo uso do microscópio (invenção também recente para a época);
- O amálgama foi sugerido como material para preenchimento cavitário;
- Afirmou-se que os dentes de crianças eram mais fáceis de se trabalhar do que os de adultos;
- Recomendou-se o uso de peças para correção da posição dos dentes (algo como um aparelho ortodôntico primitivo);
- Foram indicadas posições adequadas para o paciente no ato do procedimento;
- Sugeriu-se uma série de medidas vizando ao relaxamento do paciente (como o fato de o dentista permanecer atrás do paciente para lhe transmitir segurança).
Pierre Farchaud foi um homem à frente do seu tempo. Uma peça fundamental para o desenvolvimento da odontologia. O idealizador de boa parte dos conceitos e instrumentos que são utilizados na prática odontológica atual.
E você nem sabia quem era ele?
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